ToDivag
 

Quem não se lembra da célebre frase "COMO IA DIVAGANDO", dita já lá vão 18 anos, no primeiro almoço que esta Família organizou?

Pois é, agora o Tonica tem um espaço próprio neste site, onde entre outras divagações contará algumas das peripécias – e são muitas – que fazem parte da sua vida no Alentejo, e não só.

NOTA DO WEBMASTER
A última crónica a ser colocada na página estará sempre no topo. Portanto se quiserem
vê-las por ordem, deverão começar por baixo.

 
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AS CRÓNICAS

COLOS

O ORGULHO DE SERMOS ALENTEJANOS

NOVA AQUISIÇÃO

A SAUDOSA CHIMERA 250cc

A SAGA DO CORGO DO SACO

A ABALADA PR'LISBOA

OS FORAGIDOS - Manel & Tonica

O GALO DE NATAL

OS SAROMENHOS DE CHÂMPÁIAS

O PORQUÊ DA FUGA DO ALENTEJO

A VERDADEIRA HISTÓRIA DA BURRA

TRIBUTO AOS AUSENTES, MAS SEMPRE PRESENTES

HISTÓRIA DE UMA FOTO

 

 

 

Divag





O SEGREDO

Tonica, o mandrião!

É verdade, desde que me lembro sempre ouvi isto!! Era a Tí Cecília era a Tí Luisa, Tí Bertolina – estas duas já desaparecidas do nosso seio. Mesmo sempre dito com carinho, não deixava de ouvir a mesma lenga-lenga.

Embora com alguma razão... porque me lembro muitas vezes (quando morávamos em Champaias) de ir ao cantinho pelo Corgo do Saco mais o meu irmão Diamantino e, quando do regresso, eis o Tonica espojado no chão a não querer andar e o pobre do Diamantino lá vinha ao meu encontro e dizia: – Olha que ficas aí!!!!! Eu vou-me imbora.
Eu lá dava mais uns passos e pimba no chão outra vez. O Diamantino avançava e escondia-se por detrás de um chaparro. Eu deixava de o ver e ... ala moço atrás dele, porque no Corgo do Saco havia a fama de aparecerem bruxas à noite e nem o Diamantino era muito afoito (Ver: História do Corgo do Saco) no dito Corgo, mas o pobre do Diamantino quando via a luz do sol a querer ocultar-se no horizonte, e a coragem a faltar-lhe, não tinha outro remédio senão pegar-me às cavalitas e ala moço para fora do Corgo do Saco, não vá o diabo tecê-las. Isto foi acontecendo mesmo quando fomos morar para os Bicos, embora ainda longe do cantinho era necessário vir à farinha e fazer outros mandados. Mas nessa altura já tínhamos a famosa burra e lá íamos os dois escarranchados na dita, quando não vinha a farinha que isso é pano da outra história (Ver: A verdadeira história da burra).

Mas porquê o segredo? vamos intão lá a revelar o dito. Como todos sabem o ano passado tive um problema no coração designado de estenose aórtica, e fui submetido a uma ciurgia para substituição da dita válvula aorta, que decorreu bem como todos os familiares e amigos sabem e conhecem o processo.

Mas qual o porquê desta anomalia aparecer – perguntei eu ao médico – se tenho sido sempre saudável, militar de carreira com cursos de mergulhador, centenas de exames ao coração e nunca nada foi detectado??????

Pergunta-me o doutor: – Ó Correia, nunca teve assim umas dores ou febre que não soubesse o que era, ou umas dores no corpo, assim qualquer coisa parecida????

Então fez-se luz e eu disse-lhe:
– Bem doutor, em pequeno doíam-me muito as pernas que quase não conseguia andar!!!!
– Pois têm aí a resposta! O que o Correia teve foram umas febres reumáticas que não foram tratadas e se alojaram no seu coração, fazendo com que as válvulas envelhececem mais rápido. Assim, a abertura da sua válvula aórtica ficou velha e enrijecida e como tal não abre o suficiente paraa circulação do sangue no seu coração.

E pronto afinal. Eu fui um doente não tratado e não um grande mandrião. Comecei então a dormir mais descansado e lamentando que duas das personagens nunca venham a saber que afinal o Tonica não era MANDRIÃO

Portela da Azoia, 25 de Setembro de 2012

Um abraço do Tonica Correia

   






PENSAMENTO

Olá. Hoje como ontem os dias passam e eu penso (sei que raramente mas..), algumas pessoas amigas, e não só, dizem-me: Tónica (isto a familia). Outros: Correia quando é que tu tens juizo, só te metes em trabalhos. É então quando penso: será verdade?
Não eu sinto-me bem assim, convivendo com amigos e familiares, criando e ajundando a criar, motivar, enfim quando uma está nos eixos, eis-me a inventar outra, mas é assim que eu me sinto feliz.

E veio esta crónica a propósito de ter lido isto algures e terem-me chamado a atenção estes versos de autor desconhecido.

EU SE CALHAR SOU ASSIM (como dizem na minha terra)

 

A Idade de Ser Feliz

Existe somente uma idade para a gente ser feliz,
somente uma época na vida de cada pessoa
em que é possível sonhar e fazer planos
e ter energia bastante para realizá-las
a despeito de todas as dificuldades e obstáculos.

Uma só idade para a gente se encantar com a vida e viver apaixonadamente
e desfrutar tudo com toda intensidade
sem medo, nem culpa de sentir prazer.

Fase dourada em que a gente pode criar
e recriar a vida,
a nossa própria imagem e semelhança
e vestir-se com todas as cores
e experimentar todos os sabores
e entregar-se a todos os amores
sem preconceito nem pudor.

Tempo de entusiasmo e coragem
em que todo o desafio é mais um convite à luta
que a gente enfrenta com toda disposição
de tentar algo NOVO, de NOVO e de NOVO,
e quantas vezes for preciso.

Essa idade tão fugaz na vida da gente
chama-se PRESENTE
e tem a duração do instante que passa.

Autor desconhecido

Um abraço do Tónica e bom almoço de Família

   






Com a criação e desenvolvimento do grupo motard eu dou a mão à palmatória e
não nego que tenho descurado o nosso site tanto com crónicas novas e afins
mas como a familía mais *in* neste momento tem sido para os lados de Cascais
não quero deixar de enviar estas quadras à tia Julia antecipando o próximo
ano.

Sou de Colos, sou de Colos
E não nego a geração
Em dizer que sou de Colos
Até tenho presunção.

(por FERNANDO MANUEL RAMOS MARTINHO FRAQUITO, em http://vila-de-colos.blospot.com)

Para os naturais de Colos com carinho.
Tonica

 

   






PARA QUE O MUNDO SAIBA E OS NOSSOS DESCENDENTES
NÃO ESQUEÇAM O NOSSO ORGULHO DE SER ALENTEJANOS

Embora não tendo o meu timbre achei por bem enviar esta crónica que eleva o valor do povo Alentejano para as gerações futuras saberem que o Alentejo também tem História com H grande.

Tonica
Portela da Azoia, 24/9/2009

Porque é que há mais de 500 anos o Alentejo foi o epicentro do mundo?

  1. Porque o Rei D. João II assinou, em 1479, o Tratado de Alcáçovas, Alentejo, com os Reis Católicos, dividindo o Mundo entre Portugal e a Espanha. (Linha Horizontal de 28 graus de Latitude N).
  2. Foi também no Alentejo, no Palácio de Alcáçovas, que D. João II aprovou o Tratado de Toledo em 1480, a confirmar o Tratado de Alcáçovas. (O Palácio de Alcáçovas está agora em ruínas…)
  3. Foi do Alentejo que o D. João II aprovou e EXIGIU a demarcação da linha de LONGITUDE, a 370 léguas a oeste da ilha mais ocidental de Cabo Verde, para finalizar o Tratado de Tordesilhas, assinado em 7 de Junho de 1494. (Linha Vertical de Longitude).
  4. Foi no Alentejo, em Évora, que o Rei D. Manuel I deu a Ordem de Comando a Vasco da Gama para chefiar a Armada no Descobrimento do Caminho Marítimo para a Índia - 1497-1499.
  5. Vasco da Gama era Alentejano, nasceu em Sines.
  6. Foi em Cuba, Alentejo, que nasceu o famoso navegador Cristóvão Colon, descobridor da América em 1492.
  7. O Infante D. Henrique nomeou seu herdeiro e continuador, o sobrinho D. Fernando, Primeiro Duque de Beja, Alentejo, que continuou com os Descobrimentos.
  8. Foi o Rei D. João III, que ao tempo tinha a Corte em Évora, Alentejo, que aprovou o Tratado de Saragoça em 1529 com o Rei Carlos V de Espanha, para que Portugal ficasse com as Molucas e a Austrália.
  9. Na Vila de Mourão, Alentejo, nasceu Cristóvão de Mendonça que chegou a ser Alcaide do Castelo de Mourão e foi o primeiro descobridor da Austrália em 1522.
  10. O maior matemático português de todos os tempos era alentejano. Pedro Nunes nasceu em Vale de Guizo, perto de Alcácer do Sal. Além de inventar o nónio (Petrus Nonius) escreveu o maravilhoso livro relacionado com a ciência da epopeia dos descobrimentos: "Tratado da Esfera".
  11. Garcia da Horta, o médico português mais internacionalmente conhecido, também era alentejano e nasceu em Castelo de Vide em 1501. Escreveu, em Goa, o magnífico livro intitulado "Colóquios dos Simples e Coisas Medicinais da Índia" que foi usado durante séculos na Europa como livro didáctico nas Faculdades de Medicina.
  12. Garcia de Resende (1470- 1530), natural de Évora, foi "Moço de Escrivaninha" ou Secretário Particular dos Reis D. João II e D. Manuel I, portanto de muita intimidade com estes poderosos monarcas, tomando conhecimentos dos mais secretos negócios e planos do Estado.
  13. Mas a parte mais importante, além dos marinheiros, com que o Alentejo contribuiu para o sucesso da grande epopeia dos descobrimentos portugueses, FORAM os seus vinhos, carnes curtidas, marmelada, amêndoas, os frutos secos muito ricos em vitaminas, especialmente as vitaminas C, A e do complexo B, para evitar o escorbuto e outras nevrites mortais entre os marinheiros.
  14. Também foi do Alentejo que nasceu o grito da Restauração da Independência em 1640, se não agora éramos todos espanhóis…

É por isso que doravante poderemos bradar bem alto aos céus:

Os Portugueses descobriram o mundo inteiro e isso deve-se em grande parte aos Navegadores Alentejanos!

Alentejo
Quinhentos anos depois, até a Microsoft coloca como "default" no seu sistema operativo uma fotografia chamada "ALENTEJO"

Texto de Manuel Luciano da Silva, extraido da pagina de Pedro Laranjeira
Poderão ver mais em: http://laranjeira.com/artigos/080126-alentejo.shtml

   






NOVA AQUISIÇÃO

Pois é estas coisas acontecem até nas melhores famílias. Eu não sou diferente.

MAS VAMOS À HISTÓRIA.

Lembram-se que aqui há tempos atrás houve aí uma vertigem de aquisições?
Uns de alemãs, outros japonesas ... até a Ângela não gostou da ideia de eu arrranjar outra, mas lá se convenceu e eu até mandei a foto e tudo.

Mas pensei em arranjar outra. Ah, pois é!

E como é que convencia a Ângela? Depois de muito matutar e cansar de pensar – porque pensar para um alentejano é custoso – lá descobri como se convence uma mulher. Prestem atenção! (Os mais novos, porque os cotas já sabem.)
Comecem assim: levam-na a Praga (ou outro lugar com cervejarias). Depois:

Primeiro uma canequinha.

AngCaneca

Depois convindam uma amiga e...

AngIsaCaneca

...mais duas canequinhas.

Quando ficam neste estado...

Oculos

...já se pode apresentar a outra.

E cá está ela.

Pan

Como a primeira tambem é japonesa.

Um abraço do Tonica
Portela da Azoia, 19/3/2009

   







ZÉ CARLOS ESCREVEU NO RESULTADO DO PASSATEMPO Nº 9:

A moto não faz parte do passatempo, e pelo aspecto, não me parece que fosse do Tonica, mas se ele souber, estamos cá para ouvir.

A RESPOSTA NÃO TARDOU:

A SAUDOSA CHIMERA 250cc

Foi uma mota comprada pelo Diamantino, na qual ele teve um acidente em que atropelou um cão na recta do Porto Alto e partiu uma clavícula, quando ia para a tropa para Estremoz se não me engano. Posteriormente, e desta vez com nós os dois, rebentou um pneu e fomos a rebolar até junto de uma tasca na qual fomos logo ver um filme na TV e beber umas bjecas em Alverca.
Depois de algumas modificações foi a minha primeira mota de 250cc a qual eu parti ao meio, num acidente em Sines, do qual não sofri nada. Era a saudosa Chimera 250 italiana de gema. Veio a partir o motor comigo em cima dela a cento e tal à hora em Alverca sendo o fim dela.

Para a história da Família Correia.

Um abraço.

Tonica
Portela da Azoia, 14/1/2009


Chimera

 

Aermacchi Chimera 250

Ano de Construção: 1958–1964
Motor: 1 Cilindro a 4 tempos; 246,2 cc; 13,7 CV às 6500 rpm
Taxa de Compressão : 7:1
Transmissão: Caixa de
4 velocidades
Carburador: Dell'Orto UB 22 BS 2
Sistema Eléctrico : 6V/45W; LiMa Magneti Marelli; Bateria 6V 7Ah
Pneu frente: 2.50 X 17 R
Pneus trás: 2.75 X 17 R

   






SAGA DO CORGO DO SACO

Pois é: como já vão estando habituados, vamos recordando algumas palavritas da nossa terra. Bem, mas vamos lá à história: tinha eu 3 ou 4 anos, cotinuávamos a viver em Champaias e o meu irmão Diamantino (tambem na'tenho outro) de vez em quando era nomeado para ir aos mandados ao cantinho que como já sabem ficava nos Bicos e eu ia com ele.

O corgo do saco como também era conhecido tinha muito má fama porque se dizia que ao anoitecer apareciam lá bruxas e outros medos. O pobre do Diamantino não era lá muito afoito nessas andanças, e eu por ser novinho ou inconsciente não ligava, mas gostava muito de ir com ele (pois não havia outro) mas ele não estava muito por os ajustes!! Nesse dia, porque era já tarde e comigo ele demorava mais, ele não me queria levar. Mas lá fui com ele até ao cantinho. Feito o mandado lá voltámos nós mas já era luzcofusco e eu tinha um custume, segundo eles, que era deitar-me no chão quando estava cansado e tinham que me levar ao colo. O meu irmão a saber isso só me ia dando pressa: Tónica despacha-te olha a bruxa. Mas eu doiam-me as pernas e no chão a chorar: mano leva-me ao colo! Mas ele ía-se embora e lá à frente escondia-se atrás dum chaparro. Eu ficava sem o ver, levantava-me e toca a correr ... Ele saiu detrás do chaparro ... eu via-o e chão com ele; e o tempo passando, cada vez mais escuro e o Diamantino com uma coragem daquelas estão a ver? e eu rebolado no chão ai que dói!! Bem o desgraçado do mano lá teve de voltar atrás, pegar-me às cavalitas e pernas para que te quero direito ao monte. Passou a várzea quase de um pulo (e media aí uns 500 metros) enfim lá chegámos ao monte sem que a bruxa nos fizesse mali e o Diamantino com os bofes de fora.

São estes pequenos pormenores que a vida nos dá que mantêm viva a luz que nos guia e conforta hoje é história ontem foi vida vivida.

Tonica
Portela da Azoia, 2/1/2009

   






A ABALADA PR'LISBOA
(DOS BICOS AO BAIRRO DO MIGALHEIRO)

Atão nã é que chegou o dia em aquele pessoal dos bicos abalou na camineta pr'lisboa!! – comentou a vizinha de um dos lados porque a do outro lado já tinha abalado.

É verdade, o dia então tão aguardado chegou. O Ti Toino Alexandrino, como era conhecido, veio de Lisboa para levar a famíla!!
O meu pai chegou na altura das férias grandes para eu mais a Júlia podermos começar o novo ano na escola, e veio com umas botinhas novas para a menina Terezinha, uns botins de borracha para o Tonica, uns sapatos para a Júlia. Entretanto a Ti'Cecila já tinha feito umas fatiotas para o pessoal nas quais se incluia uma saia plissada para a menina Júlia, que era a mais velha da prol que ia viajar, e que ainda mantinha os alinhavos para não perder as pregas.

Bem, começou a aventura. Como é que íamos dos bicos até ao Cercal que era onde se apanhava a dita camineta da carrera? Estrada de alcatrão até ao Cercal nem pensar era terra batida e bem batida.
A Ti'Cecila lá arrumou os poucos tarecos e um conhecido que tinha uma carroça foi levar aquela trupe ao Cercal ainda os galos não cantavam, mas a Júlia sem a saia plissada vestida senão ela ficava logo toda amarrotada porque o tecido era especial. Chegada a hora de embarcar na camineta uma guerra, a Júlia queria vestir a saia e a Ti'Cecila: – Nem pensar só vestes a saia im Lisboa! A bendita saia ainda com os alinhavos, o Tonica tirava os macacos do nariz,
a Terezinha chorava porque via o caldo entornado (e porque era uma chorona), e ali estava aquele quadro majestoso e burlesco. Vocês imaginem: umas malas de cartão, uma alentejana sem meia dúzia de dentes, um puto despenteado com um remoinho no cabelo que não acentava nem com brilhantina, a Júlia a chorar que queria a saia vestida, a Teresa devia ser o que safava o quadro. Até que o Ti Toino, sempre mais calado, mandou calar aquela maralha, deu ordem de partida e mandou entrar pr'a carrera.

Embarcámos na camioneta da carrera aí pela manhã cedo e só lá para a tarde chegámos a Cacilhas. Aí sim houve ordem para a Júlia vestir a bendita saia, (porque íamos entrar em Lisboa) mas era necessário retirar os alhinavos e foi o que se fez no barco de Cacilhas para Lisboa (ainda estou a ver a Ti'Cecila à volta dos alinhavos com o seu buço real bem pronuciado, lenço na cabeça, tesoura na mão e lá vai disto. Mas o que é certo é que a Júlia desembarcou em Lisboa de saia plissada, e ela e nós lá fomos a pé de cacilhas até Santa Apolónia, mas a Júlia achava que a saia era um pouco comprida e lá lhe dava uma enroladela na cintura, e a Ti'Cecila lá lhe dava uma caldoça e assim chegamos à estação.

Desembarcámos em Santa Iria escuro que nem breu, caminhámos por uma vereda acima e qual não é o meu espanto ao entrar em Pirescoxe, vejo o meu irmão em frente a um caixote que dava figuras, quis logo ficar alí com o mano, mas a viagem não terminara ainda, faltava mais uma geira de caminho até ao Bairro do Migalheiro (Mealheiro) para uma casa semi-acabada e ainda à luz de candeeiro. Assim começou uma nova etapa na vida dos Correias da margem Norte.

Tonica
Portela da Azoia, 21/11/2008

   






OS FORAGIDOS – Manel & Tonica

Pois é, do Tonica tudo se espera mas do Manel, aquele moço certinho que não punha o pé em ramo verde huumm! É de estranhar. Ah, já sei, estava acompanhado pelo primo Tonica, então é normal – isto diria a minha saudosa tia Luisa – .

Mas vamos aos factos. Corria o verão e estávamos de férias, o meu primo vinha de vez em quando passar uns dias comigo no Bairro do Migalheiro como ainda diz a Ticicília.

Naquele ano eu tinha um negócio a meias com o Diamantino que consistia em arranjar, por portas e travessas, alguns livros de banda desenhada. Depois de os ler vendíamos à porta do cinema a um escudo cada um. Quando arranjávamos o dinheiro para o cinema, enrolávamos a trouxa, comprávamos bilhete e cinema com eles. Grandes filmes: Romanos e Cowboiadas.

Mas naquele dia eu tinha a visita do meu primo e não podia fazer negócio (mas podia ir ao cinema). – Então, Manel vamos ao cinema? ele diz que sim! Mas como é que íamos os dois? Eu tinha uma bicicleta muito manhosa sem travões nem farol – bem, era um quadro, duas rodas e um guiador... – e a distancia ainda era razoável. Olhei para o lado e junto à bicicleta estava a mota do meu irmão: Mota Ha-Haaaa! Era um quadro, duas rodas, um motor e pouco mais, mas para o serviço que era, servia.

O Manel mais o Tonica amontam-se na motorizada e aí vão até Sacavém – mas falta explicar que naquele tempo não podiam andar dois numa motorizada, nem o Tonica tinha licença de condução, mas para eles o cinema é que contava –. A viagem até estava a correr bem, mas ao chegar ao alto da bobadela – quem se lembra, aquilo era uma descida muito íngreme que desembocava sobre a ponte do rio trancão, e logo a seguir havia o posto da Brigada de Trânsito, que umas vezes tinha um guarda cá fora, outras vezes lia o jornal lá dentro, naquele dia estava cá fora, olhou e viu dois mânfios em cima dum aranhiço a vir desembestados (como se diz na minha terra) direito a ele. Ficou a olhar uns breves segundos, ripa do STOP e do apito e levanta os braços no meio da estrada para nos fazer parar, mas quando acabou de fazer tudo isto já nós estávamos a passar por ele, pariciamos um risco, ele deu meia volta e quando olhou já nós íamos na subida do outro lado. Eu dou a curva no cimo, viro para o cinema S. José, paro a motorizada num terreno em frente ao cinema, viro-me para o Manel e digo: – Já vistes como é?! O Manel olhou para mim assim muito amarelito e não disse nada; comprámos os bilhetes e cinema com eles.

O cinema acabou. Venho a sair e pelo vidro que dava para a rua vejo um policia junto à motorizada. Agarrei rapidamente o braço do Manel: – Espera, estamos feitos! Vem comigo e sai junto com aquela maralha toda. Subí as escadinhas da fonte, o Manel sempre colado a mim, fui ter o com o Diamantino ao trabalho e contei a novidade:
– E agora?
– Atão agora vais lá e dizes que te roubaram a motorizada aqui da oficina e assim resolves o problema.

Eu mais o Manel lá tivemos de apanhar a camineta pr'a casa. Já na viagem de regresso e ao chegar é que reparei no Manel, que aquele tempo todo se tinha mantido calado, e vi que ele estava com uma cor esquisita e então falou: – Ó primo Tonica nunca pensei que a gente se safasse!! E sempre que nos encontrávamos ele se lembrava da aventura de férias.

Em resumo, o Diamantino lá foi fazer queixa do roubo da mota mas não foi fácil porque eles não se convenciam que ele não conhecia os autores da façanha. Mas lá recuperou a mota.

TONICA
Portela da Azoia, 26/09/2008

   






O GALO DE NATAL

A vida não era fácil no ano de 1953 em pleno Alentejo profundo.
Vou tentar reproduzir a vida de um assalariado dessa altura.

Existia e penso que ainda existe, mas não nos moldes de outrora, o monte de Châmpaias.
O meu pai trabalhava nessa monte como tratador de animais, que nessa altura se denominava tratador de bestas.
Isto o que era? Durante a noite ele tinha que as alimentar. De madrugada tinha que as preparar para irem trabalhar no campo, ir com uma parelha lavrar ou ir carregar trigo ou adubo. À noite limpá-las, dar-lhes de comer, ir numa fugida a casa e voltar. Normalmente dormia na arramada... O ordenado era de 100$00 (0,50 cêntimos actuais) por mês e as comedias: farinha, azeite, feijão, toucinho, etc.

Como podem imaginar a vida para mim com 2 anos, a Júlia com 4 anos o Diamantino com 7 anos, a Ticecília e o Titónio não era fácil!... Vivíamos numa casinha logo abaixo do monte junto à estrada que ia para o cantinho dos Bicos. Claro, casa feita de taipa e bastante acanhada e como vizinhos os Cascas.
Como era tradição devia-se ter um porquinho a engordar para matar pelo Natal ... mas como a fartura não era muita tinhamos um galo, mas que rico galo, gordo, vistoso que até cobiçava. Pois é cobiçava tanto que uns tempinhos antes do Natal ... CADÊ O GALO? O vistoso galo tinha-se evaporado... E agora lamentava-se a Ticecília: Como é que vamos passar o Natal?... no dia de Natal o que comemos?...
O meu pai, como não era assim muito trouxa foi perguntando aqui e acolá, e veio a saber que tinha havido uma valente petisqueira numa tasca do cantinho com um rico galo!... Olá, aqui há história! Mais pergunta daqui e dali e eis o mistério resolvido. Tinha sido um filho já homem adulto de seu nome Custódio Casca que nos tinha roubado o belo galo!.. O nosso único vizinho!... Como vocês imaginam era muito grave roubar um vizinho e ainda por cima todos pobres. Os pais dele ficaram com tanta vergonha que deram uma indeminização!... Enfim, era o que tinham: um galo muito escanzelado e magro – como eles que eu não era magro...!
Bem, a solução foi ir ao milho guardado e alimentá-lo bem, para comermos bem pelo menos no Natal. O galito é que não recuperou da anemia crónica e tivemos um Natal muito triste com aquele monte de ossos.
Enfim era a vida que se podia ter na altura. Hoje olho para trás e para as coisas que se deitam fora e penso naqueles que ainda hoje não têm um galito para o Natal.

Um abraço a todos

TONICA
Portela da Azoia, 02/09/2008

Nota: Como hoje é dia do meus anos e comi tanto e bebi que até tenho sono creio ser a propósito.

   






OS SAROMENHOS DE CHÂMPÁIAS

Era um verão quente como todos eles no Alentejo, o meu irmão Diamantino estava de férias escolares e eu era muito novo para ir para a escola (creche ou infantário)...Há Há Há eu sei que é para rir; brincávamos no nosso parque infantil. A constar que havia uma grande descida desde a eira do monte até à nossa casa que ficava num pequeno vale. Então a brincadeira era descer essa ladeira num carro feito de madeira, com umas rodas semi-redondas, também de madeira e ir por ali abaixo que até fazia faísca quando não batíamos com o nariz no chão antes de lá chegar. Outras vezes íamos aos ninhos ou surripiar por ali alguma coizita para forrar o estômago que andava sempre numa negrura.

Foi num dia desses que eu e o mano fomos rondar o monte grande e, que maravilha, uma árvore carregada de uns frutos marelinhos – como se dizia lá na minha terra – que até doía o estômago com tanta saliva e nada na boca ... mas eu ainda disse: – Mano, o pai não disse que era para não irmos aos sarmenhos? Mas a larica era tanta que o mano saltou para cima do sarmonheiro e foi fartar vilanagem. Eis quando apareceu lá alguém que gritou: – Ai malandros que eu já digo ao vosso pai!
Claro que demos logo corda aos pés descalços e toca a correr, ainda com alguns nos bolsos dos calções e viemos para a ladeira brincar.

Passado algum tempo apareceu o meu pai e chamou o Diamantino, eu lá fui tambem ... e o meu pai disse: – Não vos tinha dito para não irem aos sarmenhos? O mano levou logo ali uns afágos e eu, antes que sobrassem uns para mim, dei corda aos pés em direcção a casa. Qual não é o meu espanto, quando o meu irmão passou por mim com o nosso pai atrás de cinto ao alto que até faziam fumo!
Eu parei e pensei, bem não vale a pena fugir que não os apanho e quanto mais tarde chegar menos apanho... Mas para meu espanto o meu pai voltou para trás, chegou junto de mim e disse: – Vai já para casa! E eu fui, o meu pai não era muito amigo de nos chegar a roupa ao pêlo mas nunca gostou que os filhos mexessem naquilo que não lhes pertencia.

Um abraço a todos

TONICA
19 de Agosto2008

Nota: Saromenhos (sarmenhos – nome alentejano) é uma fruta parecida com as pêras, mas redonda e quando maduras são amarelas. O tipo de árvore é similar à pereira (cruzamento entre pera e pêro). Também existe uma referência num livro de Mia Couto em que refere aos filhos de brancos com negras como saromenhos por não serem nem brancos nem negros.


   






O PORQUÊ DA FUGA DO ALENTEJO

Nas aldeias e nos campos do Alentejo, a luta pela sobrevivência era dolorosa e pérfida.
Era uma luta desigual. Dolorosa porque o trabalho braçal é violento; pérfida porque os camponeses, minguados de direitos, viviam na servidão.
Ajustavam as jornas de miséria com os senhores das terras. Havia tempos de trabalho e tempos de boa vida. Com esta expressão irónica, pretendiam os camponeses designar os dias, semanas, meses sem trabalho.
Doem as manifestas desigualdades nas relações de poder entre agrários e camponeses.
O Poder Político, autoritário e ao serviço dos poderosos, determinava a sujeição dos assalariados. Isto passa-se na década de 50 altura em que alguns não suportaram mais a escravidão de ganhar no verão para comer no inverno, quando chegava ou tinham alguém para lhe fiar o aviado.

Por altura de 1953/54, moravam num monte situado nos Bicos adquirido com uma pequena herança recebida pela tí'Cecilia da parte do pai, família dos Penedo Sabinos de Vale de Santiago, que era na altura a freguesia.
Esta familia na altura era constituida pelo Avô Francisco Alexandrino, pela Avó Maria Custódia, pelo pai António Francisco Correia, pela mãe Cecília Maria Penedo, pelo filho Diamantino António Correia, pela filha Maria Júlia Penedo Correia e por mim, António Francisco Penedo Correia.

A vida era muito dura. Durante o verão engordava-se um porco (quando havia dinheiro para o comprar) que se matava na altura do Natal. Tudo se aproveitava e tinha que chegar para o ano inteiro. A ementa não era variada: açorda, sopa de tomate, papas, sopa de feijão com um poucochinho de toucinho e o panito feito pela farinha que vinha em cima da burra e tinha que durar quinze dias. Era uma guerra para encher o papo: sardinha para três algumas vezes para dois, lá vinha a guerra da cabeça e o rabo, como devem compreender o rabo sempre era melhor. Andávamos descalços. No inverno era duro e o frio era de rachar, muitas poças de água ficavam geladas das quais tirávamos bocados de gelo (eram os nossos gelados), os campos ficavam todos brancos e lá iamos para a escola, para o cantinho. A pasta dos livros era um bocado de saca de sarrapilheira com uma alça a tiracolo e lá íamos pelos carreiros de areia gelada, com os pezinhos descalços que tinham uma grossura de pele (casco) que parecia uma sandália.

Por essa altura a situação do meu pai ia ficando cada vez mais díficil. O trabalho era pouco, ele foi sempre revoltado com a situação de escravidão a que estavam sujeitos os assalariados e não ficava calado com certas injustiças. Como prémio poucos feitores lhe davam trabalho.
Certo dia, pelo ano de 1958/59, um patricio perguntou-lhe se queria semear uns campos lá para os lados de Lisboa. Depois de acertarem o preço ele fez a aventura de sua vida embarcando rumo ao desconhecido, mas que ele fez com coragem como todos os outros que largaram uma certeza pela incerteza.
Passado esse ano lá nos foi visitar e levar uns sapatinhos para a minha irmã Maria Teresa, que tinha nascido entretanto em 1956 e já tinha us dois anos. Voltou a Lisboa e levou com ele o meu irmão que entretanto tinha feito o exame da 4ª classe. Voltaria um ano mais tarde para nos levar a todos mas isso faz parte de outra historia que será A ABALADA P'RA LISBOA.

TONICA
27 Junho 2008


   






A VERDADEIRA HISTÓRIA DA BURRA
Dois meninos e uma burra

Corria o ano de 1957 e era Verão quente nas planícies alentejanas. Debaixo de um frondoso chaparro protegia-se do calor uma burra pachorrenta, vendo dois moços nas brincadeiras normais da época, um com um carrinho mas feito de cortiça que constava de uma carroça com dois bois aparelhados e outro com um arco feito de ferro e uma gancheta correndo por ali atrás do referido arco.

Na esquina do monte apareceu a Ticecíla que gritou (e se ela gritava)Hó Diamantino trás a burra para meter a albarda, praíres ao Botas buscar a farinha.

As orelhas da burra levantaram-se assim como as do Tonica, que pensou: – Épa vou a cavalo na burra até ao cantinho. Porreiro pá.
Albardaram a burra e lá foram os dois pela estrada de areia que ligava o monte ao cantinho (nesse tempo não havia alcatrão), passaram pela casa da Tiluísa e lá foram à farinha.

Carregada a saca de farinha, verificaram que era pouca albarda para o Diamantino, para o Tonica e para a saca de farinha. Como o Tonica era muito pequeno para segurar a saca em cima da burra, foi a pé, e o Diamantino na albarda mais a bendita saca.
– Lá fomos caminhando, e eu com o arco e a gancheta ia correndo atrás do andor.

Feito mais ou menos meio caminho, o arco guiado pelo Tonica foi-se enfiar nas patas traseiras da burra, que ao sentir as patas presas espetou uma parelha de coices e dois pinotes, e o pobre do Diamantino e a saca de farinha voaram e estatelaram-se no chão – por sorte a saca de farinha não se rasgou, senão eram quinze dias sem pão – e a burra espetou o rabo no ar e foi até ao monte.
Passado algum tempo lá veio a burra e a Ticecíla que perguntou: – O que se passou?
O Diamantino logo muito rebiteso respondeu: – O tónica picou o cú à burra e fez-me cair!
Claro que logo aí o Tonica levou uns afagos e só teve tempo de dar corda aos pés descalços, e pernas para que vos quero em direcção ao monte.

Esta é mais ou menos a recordação que me ficou da época, mas como aos anos passados se juntaram muitas vicissitudes da vida quero crer que a minha versão dos factos é a verdadeira ... ou será a do Diamantino?

Um abraço para Os Correias.

TONICA
24 Junho 2008


   






TRIBUTO AOS AUSENTES, MAS SEMPRE PRESENTES

As palavras que deveriam ter sido ditas, são escritas por mim porque, no momento de as proferir, sempre me ata um nó na garganta. Não quero deixar de as "dizer" mesmo que seja pela caneta.

Eis as palavras que deviam ter sido ditas por mim no dia 1 de Maio de 2008.

Caros Familiares,

Este é o dia da nossa Confraternização, em que nos reunimos para comer, beber e brincar. Este ano tudo esteve à altura dos pergaminhos da Tradição Familiar d'Os Correias. Como tal, um obrigado à organização e uma salva de palmas.

Olho para todos e sinto-me feliz por um dia,há 18 anos, uns "ideotas" se terem lembrado disto! Mas tenho que elevar mais o olhar e recordar-me de uma senhora franzina, muito pequena, mesmo muito pequena, mas com um coração e alma imensa, que quando eu a visitava tinha sempre linguiça e panito da nossa terra como devia ser. Como eu tinha sempre uma brincadeira, lá dizia ela: ÉS MESMO ALARVE!

Também me vem à memória um moço de calções, só com uma alça, que corria comigo nas areias dos Bicos atrás das camionetas que iam carregar a mesma. Muitas vezes caímos, mas vencemos sempre as adversidades, até um dia em que houve uma que ele não venceu.

Mas não fica por aqui.
Infelizmente, mais duas pessoas queridas povoam o meu pensamento e nos deixam saudades. Quando os visitava, sempre havia uma açordinha "mais que não fosse" como eles diziam. Ela também franzina e pequena, mas lutadora. Ele, homem ponderado, não deixava de nos trazer umas couves ou alfaces que tratava com carinho no seu quintal, para lhe lembrar o seu Alentejo.

Correias, eu sei que a vida não pára, é certo, porque olhamos à nossa volta e vemos toda esta moçada e então pensamos: não é tão mau como isso, a vida continua.
Sem querer divagar muito mais, peço a todos que tenham sempre boa vontade e disponibilidade para estas reuniões familiares. E para vós, 3ª geração, mais empenho e ideias, porque a vossa hora chegou. A 2ª Geração está a dar as últimas cartadas.
Agora é a vossa vez, como tal, façam uma retrospectiva destes anos e melhorem, inovem, o momento é da juventude.

TONICA
18 Junho 2008


   







A HISTÓRIA
DE UMA FOTO

Tonica, 3 de Julho de 2008

  Cron1a

Corria o ano de 1971, encontrava-me eu em Moçambique numa célebre comissão no Ultramar, como já devem ter ouvido falar os mais novos, porque os mais velhos sentiram na pele por lá terem estado ou terem lá familiares próximos.
Prestava eu serviço numa lancha de desembarque grande LDG Cimitarra 103, como era designada. A nossa função era levar mantimentos e todo o tipo de material aos sítios mais inóspitos pois por terra era impossivel lá ir, devido às minas colocadas nas picadas e, sem mantimentos, as tropas que lá se encontravam não podiam sobreviver.
Numa dessas missões estávamos a pairar junto à foz do rio Marer, a fazer tempo para termos maré cheia, quando o comandante nos disse que tínhamos de ir buscar uns aldeãos que estavam constantemente a ser atacados e só tinham lá dois ou três cipáios – tropa local.
Mas nós não somos tropa especial para resgates – dissemos nós. Mas como todos sabemos tropa é tropa e vai de abicar a lancha numa praia, tirar uma Berliet que levávamos para o exército com uns quantos fangios armados – em parvos – dos pés à cabeça, para cima da Berliet e lá fomos nós. Mas antes, toca a tirar a fotografia da praxe. Quem tirou a foto, ainda me lembro bem, foi um cabo manobra que era o mestre. Homem já casado e que tinha a particularidade de todos os dias escrever um aerograma à esposa e ela retribuía – o que acontecia é que como andávamos normalmente quinze dias fora, quando chegávamos era o correio só para ele.
Bem, voltando à Berliet, a mim calhou-me uma MG42 que era uma metralhadora grande. Como eu era grande, veio a propósito, mas como só disparava balas de uma fita, eu ainda tinha que carregar com quinhentas munições ao pescoço e cintura... Pensei com os meus botões, se isto dá para o torto como é que eu me safo com este carrego? Como sou alentejano arranjei logo solução – um ajudante. Então lá pendurei a MG42 naquele moço que se vê ao fundo da foto e eu fiquei com as balas que sempre pesavam menos, mas o comandante avisou-me logo: – Correia tu és o marinheiro, tu é que és o apontador!... porque já era essa a minha função em postos de combate na lancha.
Lá fomos pela picada até ao aldeamento, que distava da foz do rio uns dez quilómetros, sem problemas de maior mas sempre com o buraquinho (aquilo que vocês sabem...) apertadinho.
Mas outro problema se nos deparou: os aldeões não vinham sem as galinhas, os porcos, as bicicletas muito velhas... Sabem como são os ciganos a fazer barulho quando há algum problema? assim eram eles, e eu a pensar: com estes cabrões a fazer este barulho é que nos aparecem aí mesmo os turras e nós estamos cagados. Resolvemos carregar tudo o que se podia e lá arrancámos direitos ao navio com aquela tralha toda, galinhas por cima de mim, porcos no chão, paus das palhotas – só visto – e eu a pensar que se eles nos aparecem aí, nem espaço tenho para apontar a metralhadora quanto mais abrir fogo, mas com tanta sorte, ou destino, não aconteceu nada de mais e lá embarcámos aquela segada toda e rumámos a norte até Mocimboa da Praia onde desembarcámos aquela tropa fandanga.
Para ser franco, sempre me ficou na ideia que eles é que não nos quiseram atacar, sabe-se lá porquê?

Um abraço a todos

TONICA

A DITA LANCHA

  Cron1b